maio 31, 2011

dia aberto

e quando chegou o dia fechado
ousei decretar feriado corporal
na campa de terra deste cemitério
fiz mirrar a minha pele exangue
aberta todas as horas do dia
e as raízes, ténues e originais,
como as veias de sangue puro
furaram a pele, uma a uma,
até me tornar árvore lisa e branca
e do meu tronco sair um cordão

foi um sonho,
senti do umbigo,
Deus só criou os dias abertos
Diário a Beatriz / dia vinte e cinco


Infinita Beatriz, estes tempos que se fizeram da saudade que te escrevi ontem, cresceram afinal o oceano de esperança que hoje nos afasta, e porque algo do teu silêncio se revela agora num esquecimento, contra o epílogo sublime das vagas, todo o meu corpo se desmorona a chamar-te onde estás, pois nem marejado pelo crepúsculo das águas profundas nos olhos te consigo já distinguir na lonjura que antes foi a distância perfeita do meu coração.

peço um livro

peço um livro
que me devolva
as águas do ventre
não me rebente
as paredes da casa
me envolva no tapete
e me segure de abrir a porta
todos os dias da minha vida
peço um livro umbilical

maio 30, 2011

o ponto negro

estive mesmo para te tirar esse ponto negro

mas tu: não, meu deus, que deve doer

dor a sério é a que trago nos olhos

que se estalagmita por teimosia

na luz cavernosa do que não é

é só mais um ponto no meio dos outros

e tu até és achacado a essas porosidades

mas porque incomoda tanto esse sinal

à aura branca e luzidia do meu corpo?

fácil e dura a resposta: é um pontinho,

um início de negrume impercetível aos demais

ou um ponto final da maldade que te habitou

e que importa isso?, perguntam as outras,

afinal ele é o mais alto, bonito e viajado

mas a mim a resposta persegue-me:

é o teu corpo que esse ponto pinta

maio 27, 2011

a terra

no dia em que o chão se levantar
haverá um atropelo de borboletas