junho 29, 2011

poeira na estrada

Ha algo de absolutamente rebelde num idoso a conduzir numa estrada de terra: quando mais anos mais lhe assapa...mais o carro se atravessa e o pó levanta...não sei se de deve a perda qualidades conduçao e controlo veiculo, se a perda da noçao do risco, se pura loucura, ou simplesmente... para mostrar ainda quem manda....sei que tem algo de poético e que portanto, me agrada.

junho 22, 2011

Passear

A gravidade deveria meter folga aos Domingos, para podermos passear pelos tectos.

junho 20, 2011

Diário a Beatriz / dia vinte e seis

Evocando o meu passeio matinal pelos terrenos da história vejo camaradas caídos sob o peso incorpóreo dos ideais. As ervas daninhas alcançam sempre irromper de um olhar, de um pulso, de um peito, e o joio cresce da fé dos cadáveres como a infância dos sonhos. Despojados. O mundo levou-lhes tudo de humanidade. Os lenços, as cigarreiras, as navalhas, os cintos, os botões. E de homens ficaram-lhes apenas as órbitas cegas, as pernas decepadas, os braços amputados, as estrelas no céu. Caminho pelo atalho dos corvos e sigo lendo com tristeza as bandeiras derrubadas como se fossem epitáfios. Liberdade, justiça, paz, perdão. Versos desprezados pela lira de Deus que eles escutaram por amor às mulheres. E apenas se pode dizer que os poetas são os verdadeiros assassinos.

junho 12, 2011

Fecho 478

A pior coisa que uma pessoa pode dizer-me é «Quero que me surpreendas». Pior para ela. Eu fico um pouco triste por ela. Além de um faz de conta inocente não devíamos tolerar comportamentos destes. Então quando acontece no universo dos amantes é motivo de arrepiar. Consegues entender porquê? Mas deve haver uma idade para tudo e como dizia Thoreau admito que vivi.

junho 11, 2011

Fecho 479

A vida é rara e andamos todos desejosos de aproveitar. Aproveitar como e o quê? Estaremos realmente a perder mil e uma coisas? Alguns escolhem dormir pouco porque não tem tempo para perder, outros sentem que são recompensados quando dormem muito. Muitos zangam-se com os seus pares quando estão de férias ou quando realizam viagens aguardadas com expectativas fartas porque não toleram que o tempo idílico esperado durante grande parte do ano seja perturbado. Talvez a sociedade devesse organizar-se de maneira a possibilitar a cada pessoa um conjunto aceitável de realização de vontades pelo menos um dia no ano, satisfazendo inclusive caprichos que não abalassem sumariamente as leis dos homens.

Pela minha parte fico ansioso quando estou com alguém extremamente preocupado em aproveitar o momento que nos ocupa – é sinónimo de incomodidade para o meu lado. Se não fosse por receio do conflito deixaria o companheiro ir à sua vida aproveitar como mais lhe conviesse, livrando-me do desconforto dos seus anseios imediatos. Faço parte por natureza daqueles que não se sentem obrigados a servir-se da extensa variedade de prazeres, não querendo que confundam com a ideia de que não sou propenso a vícios e paixões. Se há algo que me satisfaz é ficar distraído na medida que o tempo pára e o movimento à minha volta responde à velocidade que estou ligado. Nesse quase sempre inesperado e lucrativo momento é possível que dê azo a algum tipo de irresponsabilidade fruto da distorção a que o tempo fica sujeito. Não esqueço que por uma vez ou outra encontro-me na tentação de fazer o que me apetece. Nessa altura tenho uma solução – estar só, estado que ninguém de boa fé poderá negar ao seu semelhante.


junho 10, 2011

Fecho 480

Ai se pudéssemos contar todos os sonhos e visões já soprados nas alvoradas dos tempos. Espantados ficaríamos com tantos enganos. Mas um não. Um que traz todos não é engano. É o próprio sopro. É o ar enluvado a dar conta de si. É a vida que não parte de nós. Tem de ser a vida para a qual fomos convidados. Deus existe e não existe e não anseio confirmar que Deus existe e não existe mas ter por certo que sou eu que digo isto. Se a fina película disfarçada de adaptável sombra protege é porque há uma forma para salvaguardar. Um sopro é o que vem de Deus para o homem que nenhuma treva pode abafar. Às vezes, quando sonho que existem milhões de deuses e um só homem, basta-me ser um deus, como os que não precisam de possuir espaço para a voz. Como aqueles - que certamente deste conta nos dias que escutaste o vento - se derramam no próprio sopro.

Viver é provar que estamos vivos. E senão o soubermos demonstrar nunca acabaremos por nascer. Tudo não passará de uma simulação que não verá a luz do dia ou de um convite personalizado que não chegou a ser impresso. Não interessa que procure o pulsar da vida imitando aquele que teve de nascer para estar mais perto do nada factual. Tem de ser.

junho 09, 2011

Fecho 481

Começa-se por ser ou acaba-se por ser?
Há degraus? Pontos de existência? Quando olho as estrelas parece que sim.
Chegará a tempo de voltar a ser quase nada aquele que tanto se distrai a viver?
Recorrendo na desilusão de não estar apto para exprimir o que seria a visão fundamental, o chão de qualquer instante conduz-me num redemoinho para um depósito de sementeiras queimadas. É por causa da noite imposta ao sonho de tempos imemoriais que o meu Ser empalidece no cativeiro. Mas no silêncio só possível de afinar no fim da noite, a causa antiga acende-se na loucura, agora cristalina e centrada, remexendo tudo aquilo o que pensava estar destinado a alinhar-se, ou finalmente a esquecer-se.

Um pouco mais de paciência. Somos mais na última nota. Sentimos mais porque nunca tivemos tão pouco. E se formos caçadores da nossa alma não passaremos fome, nem cometeremos crime um dia de caça que seja. Não teremos vergonha quando a presa for mais lesta. Não negaremos a vida por mais que a morte seja a nossa viciada lança. Não sossegaremos mesmo que a ponta envenenada do espelho do real retire o brilho da estrela pessoalíssima que nos serve e cuida.

Somos uma coisa em comum que persegue a alma de cada um.
Somos filhos gratos do desassossego. Seja como fôr cobrimo-lo de louvor.