«...Licancabur queria dizer em Kuanza, que era um dialecto de Atamaca, terra de acima. Havia também quem, cristianizando-o, lhe chamasse de aldeia do céu, ou directamente céu. Começou a dar-me muitos detalhes do género e a implicar-me cada vez mais na investigação das almas ultraterrenas que possivelmente estavam todas refugiadas no alto do vulcão chileno.
-Descobriremos a verdade do além -disse ele
-Cuidado! Que quem busca a verdade acaba sempre por merecer o castigo de encontrá-la -adverti-o eu.»
[Enrique Vila-Matas in "Exploradores do Abismo"]
Não sei porque seleccionei este fragmento. Virá outro relacionado.
Não sei porque escolhi este momento. Este é um dos momentos, de núcleo inteiro..........................................
Sei que a busca da verdade é a ilusão mais querida, e parece-me justo procurarmos o castigo que só a cada um pertence. E não quero mais que aliviar a dor do teu castigo, tu meu herói, que encantado segues voltado para a face mais elevada da terra, onde pelo menos para ti dançam sem surpresa, céu azul e fogo do passado.
Dormem o homem e a mulher que não voltarão a ser - que a tua respiração não cesse para recordar; ou queria dizer, que a tua respiração não cesse, timidamente já - não cesses.
Pisa, por favor, a lava da encosta. São marcas alteadas do desejo engolido, matéria que não guarda o mais pequeno acontecimento. E senão te chegar tudo que ardeu desde as pontas dos tempos, pisa as almas de todos os piedosos mortos depositadas no cimo da cratera, ansiosas elas de minorar o teu castigo, a tua busca, também do teu abismo modelar as cinzas.
Não confundas a tua voz com o lago gelado
nem a visão do cume mais alto com o cume mais alto
nem a fotografia de Licancabur com Licancabur
porque o dono do momento é segredo bem guardado.